O DIREITO AO NOME
COM QUE FUNDAMENTO OS CONSERVADORES NEGAM OS REGISTOS DE NOMES?
Albano Pedro*
Nas conservatórias de registos civil em Angola é frequente sermos confrontados com a situação de não nos ser permitido registar o nome escolhido para o nosso filho ou modificar o nosso nome a gosto próprio. Essa prática que, nos dias de hoje, ganha proporções virulentas não é nova. Já nos anos 80, era prática corrente o registo mediante escolha do nome em lista pré-seleccionada. Nomes como Abílio, Sousa ou Pinheiro eram convertidos em João, Manuel ou António por exigência do conservador. Não é por acaso que estes nomes são comuns em cidadãos que nasceram naquele período. Para auxiliar pais pouco criativos na escolha de nomes, os conservadores tinham consigo uma lista de nomes sugestivos. Entretanto, o que era mera sugestão tornou-se obrigatório, por força de uma espécie de “costume administrativo”. O que foi estranho – e continua a ser – é que este mesmo costume administrativo procura afastar nomes em línguas nacionais (não surgem na lista de sugestão, tão pouco são aceites sem relutância). Costume que transformou nomes como Gomes Kambulo ou João Mangumbala em Gomes dos Santos ou João Pinto; José Kanguia em José António e por aí adiante sem o consentimento dos seus titulares. Facto que transparece a vontade de negação a própria cultura nacional e o sentimento de pertença.
Devido a esta atitude “anti-nacionalista” no registo de nomes, a maioria dos cidadãos nascidos sobretudo em Luanda – porque no resto do território nacional esta atitude era ténue – têm nomes completamente ocidentalizados. Apenas os angolanos não registados vivendo em zonas rurais puderam conservar os seus nomes nacionais como Mbala Massoxi ou Kacike Xikolomuenho. Alguns apesar de adoptar nomes ocidentais conseguiram conservar os sobrenomes em línguas nacionais como Joaquim Kalupeteka, Bernardo Malavoloneke, Marcelo Mpambukidi ou Francisco Kaboko. Casos maioritariamente facilitados fora de Luanda. No mundo globalizado de hoje o nome indicia a origem ou a nacionalidade do indivíduo, facto sensível quando navegamos na Internet ou trocamos mensagens electrónicas. E por aí, a maioria dos angolanos facilmente é confundida com portugueses deturpando a identidade nacional.
É claro que nomes que apontam para um futuro pouco tranquilo da criança entre os seus colegas de escola por vexantes e até “aberrantes” são de evitar e o conservador pode sugerir a troca. É o caso de nomes que homenageiam eventos como “Afrobasket”, “CAN”; indicam recordações marcantes “Aleluia”, “Até Que Enfim”, “Onde Estavas”; marcam dificuldades como Faz Tudo, Sofrimento ou Luta Continua; indicam doenças como Anemia Borges, José Paludismo ou Mendes Briosa; animais como Afonso Lagartixa ou Carlos Jacaré; bem como homenageiam bens materiais alcançados com sacrifícios como “Land Rover” ou “Vivenda”; homenageiam indivíduos mundialmente famosos como criminosos, caso de “Bin Laden” ou “Hitler”; ou demonstram simples emoções como “Raivoso”, “Tiravoado”, “Sungabué”, “Folhas Caída”, “Água Fresca”, “Burro da Mata”, etc.
Apesar disso pode o conservador negar o registo destes nomes? Claro que não! A Lei não inibe em momento algum que sejam registados, podendo os pais, quando queiram, fazê-lo. Outrossim, o que seja nome vexatório é um conceito que a Lei não dá corpo deixando-o vazio e liberto ao arbítrio de conservadores por impreciso. Por exemplo, é de questionar a sugestão vexatória de nomes como Coelho, Rato, Albino, Leite, Machado, Rocha, Graça, Pinto, Poeira, Rio, Bravo, Rosa, Veneno, Castigo, Figo, Carvalho, Oliveira, Sardinha, Pinheiro, Flor, Mangueira, Laranjeira, Pereira, Figueira, Trovoada, Barro, Palma, Saraiva, Porta, Pessoa, Abril, Homem, Velho, Mota entre outros. Se alguma vez foram desprezíveis, o que se sabe hoje é que prestigiam famílias e são vistos com orgulho. Também, num passado recente os nomes em línguas nacionais dados a crianças em idade escolar proporcionavam pouco conforto no seu ambiente escolar. Nomes como Kamanguingua, Kabulateu, Nangombe ou Tchissola eram, em zonas urbanas, tidos como verdadeiros acidentes. Hoje são reclamados orgulhosamente como nome próprio ou sobrenome identificando famílias. Há ainda o caso de nomes como Nzaji (faísca), Akwá (outros), Micolo (cordas), Malonga (pratos), Matuba (testículos), Nvula (chuva), Divua (Azar), Muenho (vida), Massoxi (lágrimas), Kalunga (morte), Muxima (coração) e muitos outros – se traduzidos da língua Kimbundu – que dados a partir de outras línguas nacionais nada dizem de vexatório. O interessante ainda é não haver problemas de registo civil quando nomes como Cristo, Espírito Santos ou Deus tidos como sagrados para a religião cristã são dados com orgulho as crianças provocando embaraços no ambiente religioso, ou nomes como Paloma (pomba – na língua espanhola) entre outros importados de línguas estrangeiras não são vistos como vexatórios. O que é vexatório então? Tudo indica que o conceito de nome vexatório, por subjectivo e circunstancial, deve estar ao critério do titular do nome, e nunca do conservador. De resto é o que a hermenêutica prudente sobre a Lei sugere ao conferir a faculdade do seu titular trocá-lo por razões fundamentadas.
O que é notório, na atitude dos conservadores, é o excesso de zelo e a má interpretação da Lei, levando a que listas meramente sugestivas sejam de cumprimento obrigatório. O cidadão que ver o seu nome rejeitado por imposição de um outro pelo Conservador deverá, após o registo do nome, proceder a reclamação por escrito ao próprio conservador, em caso de resposta insatisfatório, fará recurso hierárquico a própria direcção da Conservatória ou ao Ministro da Justiça nos termos do Decreto-lei 16-A/96. Em caso de provimento do recurso hierárquico, ao cidadão se reservará o direito de modificar o nome mediante novo registo civil e consequente publicação no Diário da República, com vista a afastar os efeitos jurídicos do nome revogado. Este procedimento é igualmente válido em caso de pedido para mudança do nosso próprio nome ou acréscimo de um nome nos termos da Lei. Dixit.
* www.jukulomesso.blogspot.com
O Expresso está nas bancas: Segurança, Saúde e Donald Trump
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*Miguel Cadete, Diretor-Adjunto | Expresso (Curto)*
Bom dia!
Já está nas bancas mais uma edição do semanário Expresso!
Na manchete pode ler-se que o Gov...
Há 29 minutos
1 comentários:
Fui vítimas desta negações em janeiro de 2008, na segunda conservatóra de Luanda ( à Vila Alice) quando pretendia registar o meu filho com o nome de Elciano Soberano Francisco Canhanga. Sem mais nem menos a Sra a quem tive de rigar, só para poder me atender, deu-me com um pronto NÃO.
-Esse nome não e ponto final.
Perante a situação tive de recorrer a alternativa: Dar o meu nome Luciano ao rapaz, ao que se seguio o da Avó (Delfim(na) e depois os dois apelidos Francisco Canhanga.
E me pergunto todos os dias: porque não Elciano Soberano, quando noutra conservatória, a do Bié pude registar uma menina com o nome de Princesa?
Juro que se fosse um PQP em chinés e com um dinheiro debaixo do meu BI a sra teria aceite, sem rodeios o nome sugerido para o meu Delfim.
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